sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Crudelis

Cruel
Crueldade subdérmica
Emerge do arranhão, do corte da navalha
Emerge da Dor
Carne viva
Quer disseminar
Numa epidemia de agonia e lágrimas
Pois Dor gera Dor
Dureza e rispidez
Fere, magoa
Cutuca, alfineta, faz sangrar
Agora vê escorrer
O vermelho do Remorso
Da dor que causei

domingo, 5 de setembro de 2010

Pedestais

Longe dos meus olhos, habitas
Próximo às minhas mãos, pedestais
Separam nossos corpos, nossas almas

Ideias de perfeição te envolvem
Pensamentos sublimes te removem
No meu mundo, idealizações
Separam nossos corpos, nossas almas

Quem és tu, santa não és
Próximo às minhas mãos, pedestais
Conferi à minha existência, toda dor
De amar uma projeção
Ilusão dos que amam em desespero
E, em apelo, peço
Suplico atenção

Próximo às minhas mãos, só pedestais
Aqui sozinha no quarto
As paredes não me ouvem
E você não me ouve
E as razões que me levaram para longe
Não esclareceram a lógica dos fatos
Onde está a lógica dos fatos?
Acontecimentos confundem
A razão das ideias
O sentimento das paredes vazias
Das vidas vazias de você
Quem levou você para longe de mim?
O longe não é distante o suficiente para esquecê-la
Onde está você agora?
Você está longe
Onde é o longe?
Porque nem o longe é longe o suficiente

Passado consumado

Sons anárquicos ecoam pela sala
Cores irritantes agridem meus olhos
Nesse mundo que não mais habita, me escondo
As temperaturas mudaram
Mas as calotas não derreteram

Me encontro afogada na saudade
Do sol do seu sorriso
Da suavidade da sua voz
Que não mais me diz amor
No calor dos seus lábios que não mais me beijam

Onde está o tempo
O passado escondeu o que podia ter sido
E debocha a lembrança do que foi bom
O verbo passado consumado me consome
E o presente me lacera
A dor de não tê-lo mais

O passado consumido não satisfaz nem mais a memória
De quem insiste em lembrar
Pois machuca o que um dia satisfez
E agora, é passado consumado

Estrela

Brilha pra mim...
Se lança nos meus braços...
Cobre de luz a varanda e revela...
O que as velas não puderam esclarecer...

As dúvidas dos lençóis
Molhados com o suor da sua testa larga
Seu semblante vermelho amarela meus deveres de partir
De deixar o amor morrer na cabeceira

Revela a cera inerte
Move a chama sobre mim
Brilha no breu
Vem e decreta que sou seu

Toma posse
Assina documento
Alivia o tormento da espera
Agora é a hora de ser feliz

Cemitério

As flores aqui não murcham
Porque não pedem água
Não dependem da sua mão
Mão seca!

Seca os meus olhos
Me faz chorar
Me manda ir embora
Que eu vou voltar

Pro seu silêncio
Pro seu começo
Pra sua luz
Me enterra!

Essa terra não me pertence
Essas flores não são para mim
Não mais existo
Se não pra mim

Eu me sirvo
Eu me quero vivo
Não morra por mim
Eu a amo assim

Ventania

Por que você deixou assim o nosso amor?
Preso no varal da apatia
Queimando no fundo da panela do desejo?
Por que largou de mão o açúcar?
Do mel do meu beijo

Indiferença
Indiferença derreteu o nosso amor
Desculpas do trabalho que falhou
Do tráfego que atrasou
Atrasou o tempo, rompeu a sincronia
A sincronia dos braços, dos abraços

Fecha as janelas, tranca as portas
Não deixa escapar o que é único
A única chance de sermos felizes

A ventania que afundou os nossos sonhos
Que levou os envelopes
Das cartas que não escrevi
Dos selos que não colei
Da caneta que poupei
Quando Fui Chuva
Maria Gadú
Composição: Luis Kiari e Caio Soh

Quando já não tinha espaço, pequena fui
Onde a vida me cabia apertada
Em um canto qualquer,
Acomodei minha dança, os meu traços de chuva
E o que é estar em paz
Pra ser minha sem ser tua

Quando já não procurava mais
Pude enfim nos olhos teus, vestidos d'água,
Me atirar tranquila daqui
Lavar os degraus, os sonhos, as calçadas

E, assim, no teu corpo eu fui chuva
... jeito bom de se encontrar!
E, assim, no teu gosto eu fui chuva
... jeito bom de se deixar viver!

Nada do que fui me veste agora
Sou toda gota, que escorre livre pelo rosto
E só sossega quando encontra tua boca

E, mesmo que eu te me perca,
Nunca mais serei aquela que se fez seca
Vendo a vida passar pela janela

E a empresa se fechou

A empresa se fechou.
Ninguém fechou ela, naum!...
Ela se fechou! Para a invasão, o ciúme descomedido e os dias antes da menstruação.
Ela se fechou para a possessividade e para a passionalidade inimiga da razão,
mas não para a passividade.
Eu continuei aqui, nos escombros da empresa.
Eu tentei... Você não viu, mas eu tentei. E de novo, e de novo...
A empresa não fechou.
Ninguém deu baixa.